O ILUMINISMO

 

O termo  Iluminismo indica um movimento intelectual que se desenvolveu no século XVIII, cujo objetivo era a difusão  da razão, a "luz", para dirigir o progresso da vida em todos os aspectos. Daí o nome iluminismo, tradução da palavra alemã "aufklarung", que significa aclaração, esclarecimento, iluminação.

 O iluminismo, mais do que um conjunto de idéias, foi uma nova mentalidade que influenciou grande parte da sociedade da época, de modo particular os intelectuais, a burguesia e mesmo alguns nobres e reis. Os iluministas eram aqueles que em tudo se deixavam guiar pelas luzes da razão e que escreviam  e agiam para dar sua  contribuição  ao progresso intelectual, social e moral e para criticar toda forma de  autoritarismo, fosse ela de ordem política, religiosa ou moral.

 Esse modo de pensar e de agir difundiu-se em muitos países da Europa, no século XVIII, o "século das luzes". Suas primeiras manifestações ocorreram, no século XVIII, na Inglaterra e na Holanda, com a contribuição do pensamento de Descartes, Newton, Spinoza e Locke. Mas o Iluminismo tornou-se um movimento especialmente forte na França, onde a crise do governo absolutista levou os filósofos a um debate profundo sobre a política e a sociedade de um modo geral.

 Os iluministas franceses questionavam a divisão da sociedade em "estados" ou "ordens", que privilegiava a aristocracia, em detrimento da burguesia e do povo em geral. No campo da política, criticavam a teoria do "direito divino" e da "soberania absoluta" dos governantes, defendendo a idéia de que o Estado e o poder monárquico eram resultado, não da vontade pessoal, mas de um contrato entre governantes e governados.

 A crítica ao absolutismo, formulada em fins do século XVIII pelo inglês Locke, foi aprofundada, no decorrer desse século, pelos franceses Montesquieu, Voltaire, Rousseau e pelos enciclopedistas. Das idéias de Locke e dos iluministas franceses surgiu a doutrina do Liberalismo.

 

Montesquieu e a divisão de poderes.

 Montesquieu 1689/1755, foi um dos mais influentes iluministas franceses do século XVIII. Em 1721 publicou "Cartas Persas", onde satirizava a sociedade francesa, suas leis e seus costumes, através do diálogo entre dois turistas persas. Viveu um período na Inglaterra, passando a admirar suas instituições. Em 1748, escreveu sua principal obra: O Espírito das Leis, na qual procurava explicar as leis que regem os costumes e as  relações entre os homens a partir da análise dos fatos sociais, excluindo qualquer perspectiva religiosa ou moral.

 Segundo Montesquieu, as leis revelam a racionalidade de um governo, devendo estar submetido a elas, inclusive a liberdade, que afirmava ser "o direito de fazer tudo quanto as leis permitem". Para se evitar o despotismo, o arbítrio, e manter a liberdade política, é  necessário separar as funções principais do governo: legislar, executar e julgar. Montesquieu mostrava que, na Inglaterra, a divisão dos poderes impedia que o rei se tornasse um déspota. "Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou a mesma corporação dos príncipes, dos nobres ou do povo exercesse três poderes: o de fazer as leis, e de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as desavenças particulares."

 A forma de governo ideal para Montesquieu era a monarquia parlamentar, sendo contrário à participação  popular. Ele buscou também um explicação  para a existência de tantas leis diferentes, nos diversos países, concluindo que três fatores condicionavam a multiplicidade delas: os físicos, como o clima; os religiosos e os sócio-econômicos.

Voltaire; contra o absolutismo e a Igreja.

 O escritor e filósofo francês François Marie Arouet(1694-1778) pseudônimo Voltaire, foi mais um defensor das liberdades civis do que um reformador  político. Viveu isolado por três anos na Inglaterra, onde foi influenciado pelas idéias de John Locke e de Newton. Ao regressar à França, publicou Cartas Filosóficas (1734) onde louvava os costumes e as instituições inglesas e atacava o despotismo da monarquia francesa, sendo perseguido por isso.

 Voltaire criticava as prisões arbitrárias, a tortura, a pena de morte e defendia a liberdade de expressão de pensamento. Era inimigo da Igreja Católica que chamava de "a infame" e defensor da religião natural, igual para todos os homens, sem doutrinas e os dogmas da  religião cristã . Deísta, acreditava em Deus apenas como criador  do universo, do qual é a causa e o princípio.

 Expulso de Paris, viveu na região da Lorraine, em Berlim e em Genebra, na Suíça. Em 1755, instalou-se em sua propriedade de Fernay, junto à fronteira da Suíça, onde morou até morrer, produzindo numerosos livros, peças teatrais, panfletos e cartas. Sua obra mais conhecida é "Candide", fabula filosófica sobre a natureza do bem  e do mal.

Rousseau e o Contrato Social.

 Jean Jacques Rousseau (1712-1778) era natural de Genebra, na  Suíça, filho de artesãos e lutou muito contra a miséria. Um dos mais importantes escritores do Iluminismo francês, suas teorias provocaram grande impacto na educação, na literatura e na política. Suas principais obras foram:

- "Discurso sobre as Ciências e as Artes" e Discurso sobre a "Origem da desigualdade entre os homens"1755, nos quais afirmava que o homem nasce naturalmente bom, a sociedade é que o corrompe e defende a tese de que os homens, quando viviam no Estado de natureza, eram felizes, livres e iguais em direitos porque a propriedade não existia. A desigualdade surgiu quando o primeiro homem cercou um terreno e disse "isto é meu" e os outros aceitaram; a partir desse momento, "surgiram os crimes, as guerras e as injustiças".

- "A Nova Heloísa (1761), romance onde exalta a vida familiar a moralidade e critica a sociedade francesa cortesã, de sua época.


- "Emílio"1761, obra de pedagogia que coloca como objetivos da educação o desenvolvimento das potencialidades naturais da criança, dentro dos interesses próprios dela; a educação  deve ser livre, sem a imposição de livros e regras. Para Rousseau, tanto os processos educativos, quanto as relações sociais devem partir de um princípio básico: a liberdade como direito e dever.

– "O Contrato social" (1762), obra de teoria política onde Rousseau expressa suas opiniões sobre o governo e os direitos dos cidadãos. Segundo do ele, ao deixarem o estado de natureza, os homens estabeleceram entre si um contrato ou pacto, através do qual todos seriam iguais perante às leis. O Estado  (isto é, a comunidade politicamente organizada) e o governo (isto é, o agente executivo do Estado que deve realizar  a vontade geral), nascidos do contrato entre os homens, estavam submetidos as leis que deveriam ser aprovadas pelo voto direto da maioria dos cidadãos.  O soberano, constituído pelo contrato social, é o povo unido ditando a vontade geral, cuja expressão é a lei, Afirmava Rousseau: "Toda lei que o povo em pessoa não tenha ratificado é nula; não é uma, lei."

Seus livros mais divulgados foram "Emílio" que teve 22 edições e "A Nova Heloísa" com 50 edições.  Exerceu também influência sobre os revolucionários franceses de l789, principalmente durante o "governo jacobino" (l793/94), sobretudo por meio de suas idéias sobre a igualdade, a bondade do povo, a soberania e a supremacia da maioria.

Enciclopedistas

Dentre os filósofos franceses do Iluminismo, sobressaíram-se Denis Diderot (l713/1784) e Jean D’Alembert (1717/1783), organizadores da "Enciclopédia ou Dictionnaire Raisonné des Sciences, des Arts et des Métiers" (Enciclopédia ou Dicionário Racional das Ciências, das Artes e das Profissões), obra em 28 volumes que pretendia ser uma síntese completa aos conhecimentos filosóficos e científicos da época.

Entre seus colaboradores, contavam-se destacados filósofos, matemáticos, físicos e economistas, que concordavam com o racionalismo e o liberalismo.  Os dois primeiros volumes foram publicados em l751, exprimindo concepções políticas revolucionárias um sentimento anti-religioso.
 

Os sub-literatos

 Durante o século XVIII, existiram na frança, à margem dos grandes pensadores iluministas, numerosos escritores que, por não  conseguirem destaque para as suas obras, viviam  no submundo, misturados a vigaristas, espiões da polícia. Em suas obras, mostravam um monarca indolente, cercado por auxiliares medíocres e corruptos. Suas denúncias apontavam para a podridão do regime, desmoralizando a monarquia diante dos súditos.

Livros como "Memoire sur la Bastilhe" de linguet, e "Letres de cachet et prisons d'État", de Mirabeau, denunciavam como os prisioneiros eram tratados, revistados e atirados em cubículos fétidos, sem  direito a julgamento, dormindo em colchões comidos por traças, enfrentando carcereiros violentos e tendo uma péssima alimentação. Esse livros , mesmo não tendo um programa de reforma para o Estado  francês, denunciavam o poder ilimitado das autoridades que podiam meter na cadeia qualquer cidadão, sem julgamento, com uma simples "lettre de cachet".

 Ao denunciarem as arbitrariedades, o desperdício, o parasitismo da cote, que custavam enormes somas ao Estado e mais impostos sobre a população , os sub-literatos tornavam as instituições do Antigo Regime desacreditadas, enfraquecendo os mitos de justiça e de equilíbrio que legitimavam o Monarca ais olhos do povo.

Os fisiocratas e o laissez faire

 A crítica dos iluministas ao Absolutismo atingiu também a política econômica desse regime: as práticas mercantilistas e a intervenção  do Estado na economia eram combatidos, na França, pelos adeptos da escola econômica fisiocrática.

 Os fisiocratas (de fisio, natureza; crato, governo, portanto governo da natureza) afirmavam que a verdadeira fonte de riqueza de uma nação  era a terra, sendo a agricultura a principal atividade econômica. A indústria e o comércio apenas transferiam riquezas já existentes de uma pessoa para outra.

 Assim como o universo e o corpo humano eram regidos por leis naturais, a economia também  o era, tornando-se pois desnecessária qualquer regulamentação  feita pelo Estado. O lema dos fisiocratas era: laissez faire, laissez passer, le monde va de lui-même. Seus principais representantes foram François Quesnay, fundador da Escola fisiocrata e Turgot, ministro das finanças de Luís XVI entre 1774 e 1776.

 Como ministro, Turgot procurou diminuir a ação do Estado na economia, aperfeiçoando o sistema de arrecadação , abolindo algumas corvéias e facilitando o comércio de cereais. Nessa época, existiam barreiras alfandegárias entre as diversas regiões do país, que dificultavam a comercialização e a circulação  de mercadorias. O ministro  decretou: que livre a todas as pessoas ... exercer a espécie de comércio e as profissões artesanais que queiram...

 Turgot tentou fazer uma reforma fiscal para que a aristocracia pagasse impostos, assim como os demais franceses. Mas, enfrentou um forte oposição das classes privilegiadas, sendo demitido em 1776 e suas medidas revogadas, agravando a crise financeira da monarquia.

O deísmo

 A religião mais tipicamente iluminista é o deísmo: reconhece-se a existência de uma esfera sobrenatural e, especialmente, a existência de um deus pessoal e criador do universo, conceito ao qual se chega racionalmente, a partir da observação  da harmonia que reina no universo, mas não se reconhece nenhum outro atributo de Deus e, menos ainda, não se admitem cultos, ritos, dogmas, etc. A religião se torna um modo de sentir, um íntimo sentimento de comunhão com Deus, que decorre da adesão sentimental à harmonia da natureza.
 

REFORMA OU REVOLUÇÃO

0 pensamento dos "phillosophes", como eram conhecidos os ilumi nistas, não tinha como propósito conduzir a uma revolução. Os iluministas propunham a reforma do Estado, submetendo as monarquias absolutistas às restrições emanadas das leis aprovadas pelos parlamentos ou assembléias de representantes do povo. Eles consideravam necessário educar "os monarcas, a fim de que estes pudessem preservar os direitos do cidadão e a liberdade do indivíduo.

Do ponto de vista econômico, os iluministas criticavam os monopólios, as restrições à produção de mercadorias por corporações de ofício, as leis de proteção a determinado número de indústrias e a intervenção do Estado na economia, considerada desnecessária.

0 modelo da reforma era a Inglaterra, que após a Revolução Gloriosa de 1689 manteve a Monarquia, porém com o poder controlado pelo Parlamento, formado por nobres e burgueses preocupados na defesa de seus interesses, tais como a propriedade, a liberdade de opinião e o poder de legislar.

As idéias liberais dos iluministas tiveram grande penetração na França, onde um Estado falido e uma aristocracia apegada a seus privilégios tentavam, de todos os modos, opor-se as mudanças exigídas pela burguesia e pelo povo. Na Revolução Francesa de 17891 os princípios ilumí nistas surgiram resumidos no lema revolucionário: "LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE. No continente americano, as idéias liberais serviram para orientar os movimentos pela independância politica das colônias.

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Autores: Olga Maria A. Fonseca Coulon e Fábio Costa Pedro
Apostila: Dos Estados Nacionais à Primeira Guerra Mundial, 1995, CP1-UFMG